Jorge Moreira Leonardo

Os Filhos (VIII)

10 de Agosto de 2022


Ao aproximar-se o fim do ano lectivo e consequente início das férias, o seu amigo Afonso falou-lhe na hipótese dele passar o mês de Agosto em S. Martinho do Porto, na casa de Verão que os pais possuíam. E, como para o convencer, acrescentou: - A minha prima e o pai vão lá estar! Ela, aliás, já o havia informado, pois, após o encontro em Lisboa, telefonavam-se com alguma frequência, sem contudo assumirem o namoro. Nunca tinha abordado o seu relacionamento com a prima. Já confidenciara ao amigo o seu amor pela Joana e receava que essa dúbia situação, envolvendo uma parente que, sabia, lhe era muito querida, podia prejudicar uma amizade que muito prezava e de forma alguma queria pôr em risco. Ficou sabendo que o seu segredo já não o era mais e tranquilizou-o a certeza de que, pelo contrário, parecia até existir uma certa receptividade. Aceitou satisfeito e lá foi de abalada com o amigo passar as melhores férias que alguma vez gozara e durante as quais o seu namoro com a Sofia ficou praticamente confirmado. Para a Joana e sua Madrinha enviou cartas com justificações vagas pouco se importando já com a credibilidade que elas iriam merecer. Foi este o primeiro sinal de que, no seu coração, a ambição começava a ganhar terreno ao amor. A ideia de, pelo casamento, e, logo após o fim do seu curso,  ter lugar assegurado num escritório já com nome feito, era demasiado apelativa. Principalmente sabendo que alguns advogados recém-formados encontravam sérias dificuldades para se afirmarem, o que levava um grande número a aceitar lugares em organismos do Estado, onde muitas vezes auferiam vencimentos ao alcance de funcionários sem qualquer formação universitária. Além disso, mercê dos frequentes contactos com a família do Afonso, experimentara um estilo de vida de que não era fácil abdicar, e que, como modesto advogado na sua terra, talvez nunca atingisse. Porque, então, perder uma coisa que estava mesmo ali à sua mão? Chegou mesmo, um dia, a surpreender-se com este pensamento: - Ela pode não ser a mulher dos meus sonhos, mas é a mulher que me pode ajudar a realizar muitos dos meus sonhos. Hoje, odeia-se só pelo simples facto de ter sido capaz de sustentar um pensamento tão repugnante.

Quando regressou a Coimbra, encontrou uma carta da Joana. Rasgou o envelope e começou a lê-la com sofreguidão. Era o que esperava mas ao mesmo tempo mais receava. Através da inconfidência dum amigo comum, tal como ele estudante em Coimbra, ela soubera da sua relação com a Sofia e rompia com o namoro. Embora a carta viesse ultrapassar o problema que ele encarava com maior ansiedade - o rompimento do namoro - não ficou feliz. Porque a certo trecho - e isto chocou-o profundamente - ela afirmava: - Amar-te-ei para sempre! Mas não ignoro que um dia quando perceberes o futuro que perdeste por minha causa, passarás a odiar-me e com isso não poderei viver. Nem acabou de ler a carta, pois tinha os olhos rasos de lágrimas. Saiu e foi parar a um bar distante, começando a beber copo atrás de copo. Muito mais teria bebido não fora o dono do bar recomendar-lhe que fosse para casa. Pelo caminho, foi-se interrogando, apesar de toldado pelo álcool:  -  Porque não teria ela preferido insultá-lo? Porque não lhe chamara ela de cobarde e venal? Teria sido menos doloroso. Ou seria ela tão cruel que escolhera as palavras que, sabia, mais iriam fazê-lo sofrer? Não, a sua Joana era incapaz de tal. Aquelas palavras tinham-lhe brotado espontâneas do coração, disso não tinha a menor dúvida. Chegado ao seu quarto, atirou-se mesmo vestido para cima da cama e pouco depois adormecia pesadamente. No dia seguinte, apesar da ressaca, foi tratar da passagem para a Terceira onde passou grande parte do mês de Setembro no fim do qual regressou a Coimbra para a frequência do 5º. e último ano.

Durante a estada na sua terra praticamente não saiu das Fontinhas, embora várias vezes tivesse pensado procurá-la, mas logo desistia da ideia.

Ao aproximar-se o fim do ano lectivo e consequente início das férias, o seu amigo Afonso falou-lhe na hipótese dele passar o mês de Agosto em S. Martinho do Porto, na casa de Verão que os pais possuíam. E, como para o convencer, acrescentou: - A minha prima e o pai vão lá estar! Ela, aliás, já o havia informado, pois, ap&oacut…





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