Julguei que os eleitores açorianos iriam castigar a IL e o Chega por terem derrubado o Governo Regional PSD/CDS/PPM e terem provocado eleições legislativas regionais antecipadas, mas, afinal, aqueles partidos cresceram, com a IL a manter o seu único deputado e com o Chega a mais do que duplicar os seus mandatos.
Esta incoerência só é explicável pelo facto de muitos eleitores não estarem informados sobre as origens e o desenvolvimento da crise que derrubou o Governo Regional PSD/CDS/PPM e terem aceitado, credulamente, a versão inverídica dessa crise que foi divulgada por Montenegro e Bolieiro, segundo a qual o Governo Regional teria caído por um «conluio político entre PS, Chega, IL, PAN e BE».
Todavia, é indesmentível que únicos responsáveis pela queda do Governo Regional foram os partidos que eram “aliados” da Coligação PSD/CDS/PPM, a saber, a IL e o Chega, por, em Março de 2023, terem denunciado os acordos de incidência parlamentar que suportavam o Governo e por, em Novembro de 2023, não terem votado a favor do Orçamento Regional.
A vitória eleitoral da Coligação PSD/CDS/PPM foi curta (deu-lhe uma maioria de 26 mandatos contra 23 do PS, 5 do Chega e 3 do BE, da IL e do PAN) e poderá ter-se ficado a dever, antes de mais, ao facto de aqueles três partidos se terem apresentado como coligação e terem, assim, potenciado, à luz do instrumento de conversão de votos em mandatos do método de Hondt, um aproveitamento de votos que não elegeriam deputados se tivessem concorrido em separado…
A redução da abstenção de 54,6% para 49,7%, tendo sido um facto positivo, pode também ter beneficiado eleitoralmente a Coligação PSD/CDS/PPM, porque, segundo a referida versão mistificadora das causas da queda do Governo Regional, promovida pela Coligação, o que estaria em causa seria a incerteza sobre se a coligação de direita, que teria sido derrubada pela “oposição”, iria ou não aguentar-se…
No mais inclino-me a considerar que a vitória da Coligação PSD/CDS/PPM se ficou a dever menos a algum mérito especialmente assinalável da sua governação – caracterizada, sobretudo, por projectos e intenções – do que ao demérito do descrédito de 24 anos de governação regional do PS e da inocuidade das suas propostas eleitorais…
Exemplo chocante dessa inocuidade foi a afirmação de Vasco Cordeiro, em campanha eleitoral, de que «nunca deixámos nenhuma ilha para trás», sabendo-se que os governos regionais do PS privilegiaram sempre o investimento em São Miguel e na Terceira em prejuízo do desenvolvimento das outras ilhas, inclusive do Faial…
O PS/Açores anunciou na passada 6ª feira que vai votar contra o programa de governo da Coligação PSD/CDS/PPM.
São farisaicas e meramente eleitoralistas as razões que o PS invoca para não viabilizar, pela abstenção, um Governo Regional minoritário PSD/CDS/PPM.
Ao contrário do que Pedro Nuno Santos diz, não há «diferenças substanciais» na visão que o PS e o PSD têm da sociedade: ambos são partidos sociais-democratas, que, em nome do “respeito” pela soberania do mercado, têm, lamentavelmente, feitos crescentes cedências ao neoliberalismo.
O PS tinha o dever de viabilizar um Governo Regional PSD/CDS/PPM minoritário, para, assim, travar o processo de “normalização” do partido de André Ventura, que se iniciou com o acordo de incidência parlamentar celebrado em 2020 entre a Coligação PSD/CDS/PPM e o Chega, mas que pode consolidar-se, no caso, muito provável, de Bolieiro ceder às exigências do Chega de participação no Governo ou de estabelecimento de um «acordo de incidência governamental»: é que Bolieiro, apesar de afirmar que quer governar com maioria relativa, é ambíguo sobre a matéria quando diz que se recusa a «fazer cercas sanitárias» e que «o povo é [que é] soberano, não sou eu»…
É certo que uma solução governativa resultante da viabilização pelo PS de um Governo minoritário PSD/CDS/PPM seria sempre instável e dela poderia resultar, no curto ou no médio prazo, a queda do Governo e a necessidade de, mais uma vez, serem antecipadas eleições para a ALRAA…
Mas teria ficado mais longe o perigo do envenenamento da democracia pela participação no Governo ou pela influência nele de um partido xenófobo, racista e antidemocrático, mesmo que tal influência se exercesse pela via, que alguns comentadores admitem, de uma abstenção do Chega e de um voto favorável do PAN na votação do programa governamental da Coligação PSD/CDS/PPM.