Entretanto o Inspector interrogou o sem-abrigo. Este confessou que assistiu ao assassínio feito à navalhada. Que o viu escrever algo na palma da mão mas que não teve ocasião de ver se foi na esquerda ou na direita. Que lhe rebuscou os bolsos e levou o que ele supõe terem sido cautelas da lotaria. Que quando deu pela sua presença se lhe dirigiu tirou-lhe os óculos, observou-o minuciosamente e perguntou: - És mesmo cego?
Respondi: - Infelizmente, sim.
Ele então deu-me uma pancada num ombro e escarneceu: - Vá lá! A tua cegueira salvou-te a vida. Mal ele se afastou corri para o meu lar-abrigo donde só saí hoje porque li a notícia de que o assassino tinha sido preso. Qual não é o meu pavor quando o vi na rua. Corri de imediato para aqui. Bem sei que vou ser preso por andar a intrujar as pessoas, mas antes preso do que morto.
E que sabes do cauteleiro? Sabes onde morava? Quem lhe vendia a lotaria? Perguntou o inspector.
- Sei tudo acerca dele, até porque éramos amigos. Ele não tinha qualquer familiar – respondeu.
- Por agora é tudo. Até que tudo se esclareça vais ficar aqui. Tens onde dormir e até alimentação.
- Mas e o meu cãozinho? Lembrou o sem-abrigo. Prefiro voltar para a rua a abandoná-lo.
Um dos adjuntos sugeriu: - Conheço um canil onde ele ficará bem. Até lhe podem prestar alguns cuidados que ele bem precisa. E são só alguns dias. O sem-abrigo concordou e foi com um agente levar o “seu amigo” ao canil.
O Inspector da PJ mais dois adjuntos estabeleceram um plano meticulosamente elaborado para desta vez não subsistirem lacunas. O sem-abrigo iria reocupar o seu lugar como falso cego. Seria protegido por dois agentes disfarçados. Quando visse o suposto assassino, como sinal, tirava os óculos escuros com que simulava a sua cegueira.
Não se procederia à detenção, de imediato. Mas um agente seguiria todos os passos do identificado. Incluía uma visita à casa da vítima na procura de algo que ajudasse na investigação. E também a quem lhe vendia lotaria.
Da visita à modesta moradia do cauteleiro, mobilada com uns carunchados móveis, entre os quais uma pequena secretária sobre a qual apenas lhes despertou a atenção uma lista com diversos nomes com pequenas verbas inscritas. Deduziram que a vítima devia vender lotaria a crédito a pessoas que lhe pagavam quando recebessem os seus vencimentos. Apenas uma verba lhes despertou a atenção: barão: 1975 euros.
De seguida dirigiram-se ao fornecedor de lotaria que os informou que estranharam a visita de uma pessoa de boa apresentação que exibiu várias cautelas com as terminações dos números da lotaria. Porque o normal era o próprio cauteleiro pagar e depois reunia todas as cautelas e vinha cobrar o valor.
- Serão capazes de identificar essa pessoa? – perguntou o inspector.
- Perfeitamente! Respondeu o que se tinha apresentado como gerente.
Quando o Inspector e um dos adjuntos chegaram à PJ encontraram os dois agentes que ficaram a proteger o sem-abrigo que já identificara o assassino e que um deles o seguira.