O Presidente do Governo Regional dos Açores assumiu o comando das Áreas Marinhas Protegidas, para o bem e para o mal. Deixou os Secretários Regionais do Mar e do Ambiente fora deste empreendimento, talvez porque não concordassem ou tivessem outras abordagens para atingir os objetivos.
O desenvolvimento deste dossier, onde foram e estão a ser gastos milhares ou até milhões de euros, está suportado no Programa Blue Azores, liderado pela Fundação Azul, sediada em Lisboa. A propósito e embora seja absolutamente pertinente, desconhece-se, com rigor, qual o papel que foi reservado neste processo à Universidade dos Açores e ao Instituto Okeanos e qual a influência que tiveram nas várias decisões tomadas. Defendo, mais uma vez, que os açorianos devem ter acesso detalhado ao dinheiro gasto até agora com este processo, saber como e onde foi aplicado.
Até 15 de setembro passado, a proposta de Decreto Legislativo Regional para a criação de Zonas Marinhas Protegidas, para além das 6 milhas, esteve em discussão pública, seguindo um processo, do ponto de vista legal, semelhante a qualquer outro diploma. Mas este era um processo que merecia uma participação muito alargada e efetiva o que não creio tenha acontecido. Deverá ser motivo de grande preocupação a forma pouco eficiente como este processo decorreu, consubstanciado: ou em sessões de esclarecimento realizadas numa fase precoce e sem definições de área; ou, no caso das últimas organizadas à pressa e de uma forma atabalhoada, realizadas apenas em São Miguel, Terceira e Faial, já em período de audição pública, deixando seis ilhas de fora e, onde os cenários foram apresentados como factos consumados e sem margens para alterações substanciais.
Este é um processo confuso, sem base científica, sem dados que justifiquem as escolhas e áreas selecionadas. Isto é especialmente grave quando havia um histórico de colaboração entre a comunidade piscatória e o meio científico, como demonstrado pelo caso do Banco Condor, onde houve um notável trabalho conjunto nos últimos anos.
O Banco Condor é uma das zonas offshore, para além das 6 milhas, que agora é proposta como Reserva Marinha, revogando o compromisso assumido com os pescadores da ilha do Faial. Foi acordado um período para estudos e restabelecimento de equilíbrios, mas esta proposta ignora o acordo e estabelece uma Reserva Marinha Protegida nas costas dos Pescadores.
A criação de reservas marinhas por si só não garante o equilíbrio nem a proteção dos ecossistemas! É uma tarefa complicada devido à vastidão dos ambientes marinhos e à falta de recursos para fiscalização adequada. No caso dos Açores e por tudo o atrás referido, é preciso acabar com a abordagem baseada apenas em decretos. Na verdade, temos um excesso de leis, sem que tenha ocorrido uma revisão geral da legislação em vigor, algumas sobrepostas, e adicionar mais não garantirá os resultados desejados.
Além disso, existem recentes ameaças ao ecossistema marinho, como a Rugulopteryx okamurae, uma macroalga invasora com rápida expansão. Não devemos criar áreas protegidas sem entender o verdadeiro impacto desta situação nos ecossistemas e na pesca.
As áreas offshore agora propostas, em particular os bancos tradicionais de pesca da comunidade piscatória da ilha do Faial, contrariamente aos constante da proposta, não devem ser classificadas como áreas marinhas protegidas, mas como áreas de recuperação de recursos, seguindo o exemplo do Banco Condor.
Caso contrário, onde ficará a sustentabilidade de centenas de empregos? Como serão garantidas as devidas compensações aos armadores? Como serão abastecidos os mercados?
Existem evidentes contradições neste processo. Por um lado, o Governo Regional reivindica uma maior quota em espécies como o Goraz e o Atum, mas, por outro lado, cria reservas que impedem a sua captura. Estamos a lidar com incertezas e falta de clareza, o que nos impede de visualizar claramente os nossos objetivos. É urgente e necessário estabelecer um pacto de 30 anos que envolva todas as forças políticas, pescadores, a comunidade científica e instituições representativas. Sem isso, continuaremos a dar passos em falso e a deitar milhões de euros ao mar, sem retorno efetivo.
Precisamos de interlocutores em quem possamos confiar, cientistas que trabalham nos mares dos Açores há décadas e que têm um histórico
comprovado. Devemos exigir neste processo mais ação e menos marketing, que até agora só serviu para iludir os açorianos.
Tendo por base as considerações acima, é recomendável que a implementação de áreas marinhas protegidas seja abordada com cuidado, devendo ser adiada a sua implantação.
Embora a proteção dos ecossistemas marinhos seja louvável, não devemos subestimar os potenciais riscos associados a essa abordagem. É essencial adotar medidas equilibradas que levem em consideração tanto a conservação marinha quanto as necessidades socioeconómicas das comunidades locais, garantindo um futuro sustentável para os ambientes marinhos e para as gerações futuras.
O Governo Regional dos Açores está determinado em cumprir os seus compromissos a todo o custo, indo para além do razoável e aceitável, o que irá comprometer o sustento dos pescadores açorianos, pondo em causa a sustentabilidade de outras zonas que serão alvo de pesca intensiva.
O programa Blue Azores não alcançou os seus objetivos, não conseguiu envolver a fileira da pesca, nem a comunidade científica regional, continua claramente em águas turvas, apesar de afirmar que realizou muitas consultas ao longo de 20 meses. Se não fosse assim, não haveria tanta contestação a este processo. Os dados não são partilhados e os estudos que fundamentam as ações e as opções tomadas não são divulgados, embaciando um processo que deveria ter sido conduzido de outra forma.
A economia azul nos Açores continua a enfrentar desafios significativos, um deles são as minorias que consideram defender melhor os interesses do mar dos Açores, do que quem construiu e navegou todo um caminho até aqui.