Impunha-se a efectivação dum balanço ao Caixa, mas isso equivaleria a uma quase acusação formal e ele não se atreveria a tanto sem conhecimento do seu chefe. Nem tampouco o próprio contabilista o faria sem por sua vez ter obtido autorização do gerente.
No entanto, não foi capaz de ocultar um certo triunfalismo quando, ao ser recebido pelo chefe, anunciou: - Tinha razão chefe! O assassino escapou pelo porta-cartas e até suponho saber qual a arma do crime.
O Chefe, entre irritado e curioso, rosnou: - Que está você para aí a dizer?
Ele então narrou a análise que fizera dos elementos de posse da polícia e também as diligências junto do escritório. E concluiu dizendo: - Agora só falta convencer o gerente a mandar efectuar um balanço ao “caixa” e confiar que o suspeito ainda não terá reposto a verba que, suponho, utilizou abusivamente e esteve na origem do crime.
Quando, finalmente, conseguiram chegar à fala com o gerente e lhe relataram os últimos desenvolvimentos da investigação, este concordou em mandar efectuar o balanço, e, em jeito de prece, apenas disse: - Deus queira, os senhores estejam errados!
Ao entrar no escritório dirigiram-se, de imediato, para o “caixa”, mas, quando o gerente disse a que vinham, o caixa, deixando-se cair na cadeira, anunciou: - Não vale a pena! Fui eu!
No seu depoimento confessou que, para atender às exigências da mulher, cobrira-se de dívidas. Na esperança de obter o dinheiro para as satisfazer começou a jogar no bicho verbas cada vez maiores numa tentativa desesperada de recuperar o perdido, mas cada vez mais se afundava. Já devia dinheiro ao próprio bicheiro. Ainda tentou obter um empréstimo bancário, mas sem sucesso. Finalmente procurara o agiota que lhe prometeu arranjar o dinheiro, razão das sucessivas justificações para adiar o balanço. A insistência da vítima é que precipitara os acontecimentos.
Confirmou todas deduções do adjunto e considerou-se perdido quando o viu fazer a experiência das fechaduras. Ainda tentou encobrir a esposa, mas colocado perante a impossibilidade de ter içado o corpo sozinho e incapaz de justificar a presença dela em frente do escritório, admitiu a sua cumplicidade.
Acabado o depoimento, levaram-no à presença do Juiz onde confirmou tudo, já, então, ao lado dum advogado oficioso. O Juiz deliberou que o réu aguardaria julgamento na prisão e mandou deter também a esposa.
Quando tudo terminou, o chefe chamou-o ao seu gabinete e, estendendo-lhe a mão, disse: - Parabéns. Foste brilhante!
Ele agradeceu e teve a sensação que, de contente, o coração lhe saltava do peito. Estava redimido.
Cá fora, aguardavam-no os colegas do departamento para o felicitarem. Ele, então, embora satisfeito com a atitude destes, retribuiu-lhes a ironia a que o haviam sujeitado: - Elementar, meus amigos, elementar.
FIM