Carlos Frayão

A oitava revisão constitucional e a autonomia (3)

12 de Janeiro de 2023


O Projecto de Revisão Constitucional do PS não contém propostas sobre as autonomias regionais porque, segundo António Costa, se contivesse, tal seria «uma falta de respeito pela autonomia das assembleias legislativas regionais», por nelas estar em curso um trabalho sobre esta matéria.1 

O PS/Açores anunciou que nada fará para o Projecto de Revisão Constitucional do PS incluir a temática da Autonomia e também o justificou com o facto de estarem a decorrer na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA) os trabalhos de uma Comissão Eventual para o Aprofundamento da Autonomia (CEAA).

Não foi divulgado, que eu saiba, o trabalho produzido pela CEAA, mas a imprensa regional divulgou recentemente alguns dos temas que nela já foram aprovados e esclareceu que o da extinção do cargo de Representante da República (RR) ainda está a ser discutido.2

Se o Grupo Parlamentar Regional do PS tiver apresentado, eventualmente, na CEEA, alguma proposta de extinção do cargo de RR, presumo que ela não será a mesma que apresentou, creio que em 2019, na CEVERA3, porque já terá compreendido, provavelmente, que tal proposta, para além de estar ferida de inconstitucionalidade, é um falso aprofundamento da Autonomia...

Essa proposta atribuía ao Presidente do Governo Regional (PGovReg) a competência do RR para assinar e mandar publicar os diplomas regionais – com o PGovReg a passar a ser eleito pelos deputados da ALRAA, mas passando a ser nomeado pelo Presidente da República (PR) –  ao mesmo tempo que atribuía a competência do RR para fiscalizar a constitucionalidade dos diplomas regionais a um Provedor da Autonomia, um novo órgão de governo próprio da Região, a criar, que seria eleito por uma maioria qualificada dos deputados da ALRAA.

Tal proposta respeitava, em parte, a Constituição da República Portuguesa (CRP), na medida em que acabava, objectivamente, por aceitar o disposto no seu art. 120º, nº 1, segundo o qual é o PR que representa a República, pelo que tem competência para nomear o PGovReg, seja directamente, seja através de um representante seu que designe para exercer as suas competências na Região.

No entanto, ela distanciaria mais a República, representada pelo próprio PR, dos órgãos de governo próprio da Região e estes daquela, dificultaria a audição, legalmente obrigatória, em determinadas situações, dos partidos com assento na ALRAA, e não corresponderia a um efectivo aprofundamento da Autonomia, mesmo “enfeitada” com o artifício de o PGovReg, antes de ser nomeado pelo PR, ser eleito pelos deputados da ALRAA...

Já na parte em que atribuía a competência do RR para fiscalizar a constitucionalidade dos diplomas regionais a um Provedor da Autonomia, aquela proposta seria, manifestamente, inconstitucional, quer à luz do conceito unitário de Estado, quer à luz do princípio de que é o PR que garante a unidade do Estado, consagrados, respectivamente, nos arts. 6º, nº 1, e 120º, nº 1, da CRP.

Não estou esquecido de que há pouco mais de um ano, na sessão comemorativa do 45º Aniversário da instalação da ALRAA, o PS/Açores defendeu que a próxima revisão constitucional deveria definir o Estado Português como unitário e regional, posição que, aliás, o PGovReg reafirmou na mesma sessão.

Já não tenho espaço para relembrar os argumentos, que aqui transcrevi há algum tempo, com que os nossos mais ilustres constitucionalistas sustentam que não é apropriado falar de Portugal como um Estado regional.

Mas ainda tenho espaço para dizer que estou convencido de que a Direcção Nacional e a maioria do Grupo Parlamentar do PS na AR não acompanham estes delírios autonómicos inconstitucionais do PS/Açores e de que o PS/Açores poderá vir a precisar de tempo para explicar às pessoas que algumas das suas reivindicações autonómicas ultrapassavam, inaceitavelmente, o quadro constitucional vigente. 

Estas são algumas das razões pelas quais considero que é discutível a autenticidade dos argumentos invocados pelo PS para não ter apresentado propostas sobre as autonomias regionais no seu Projecto de Revisão Constitucional.

 

1 Jornal Económico de 11/11/2022.

2 Francisco Coelho, Deputado do PS na ALRAA (Incentivo de 23/12/2022).

3 Comissão Eventual para a Reforma da Autonomia da ALRAA.

 

O autor não segue as regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990

 

O Projecto de Revisão Constitucional do PS não contém propostas sobre as autonomias regionais porque, segundo António Costa, se contivesse, tal seria «uma falta de respeito pela autonomia das assembleias legislativas regionais», por nelas estar em curso um trabalho sobre esta matéria.1 

O PS/Açores anunciou que nada fará para o Projecto de Revisão Constitucional do…





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