Jorge Moreira Leonardo

Os Filhos (XIV)

21 de Setembro de 2022


Findo o estágio que decorreu com normalidade e durante o qual teve oportunidade de avaliar a importante clientela que o sogro fora capaz de granjear - e também a sua grande fortuna - acertou-se a data do casamento que - para não variar, pensou com ironia – se realizaria em Castelo Branco, onde aliás residia quase toda a família dela. Ele custeou a viagem dos pais e encarregou a madrinha de os orientar e inclusivamente escolher umas roupas condignas. Ainda procurou uma pensão para os alojar, mas a avó da Sofia, sabedora do facto, exigiu que eles ficassem lá no solar onde graças a Deus o que menos faltava era lugar. Estas preocupações dele não significavam que alguma vez se tivesse envergonhado da modéstia dos pais que, aliás, adorava e já tinha prometido que quando possuísse meios havia de lhes proporcionar o conforto que nunca tinham conhecido. Porém, já conhecendo o requinte que predominava no solar dos avós da noiva não queria de forma alguma sujeitar os pais a situações humilhantes.

O casamento decorreu com a pompa tradicional na família dela. Os seus padrinhos foram o Afonso e noiva que também já tinham data marcada para o casamento. Durante a cerimónia ele provocou um pequeno percalço que, durante uns longos segundos, deixou toda a gente em suspenso. Na altura de pronunciar o sim ele olhou na direcção da noiva e, por momentos, julgou ver, através do véu, o rosto da Joana. Depressa se recompôs e lá pronunciou a palavra que o havia de ligar a ela para toda a vida.

Já sozinhos no carro a caminho da boda, ela perguntou-lhe o porquê da hesitação e ele mentiu afirmando que queria gravar bem na sua memória aquele momento. Ela acreditou e encostou-se a ele com o rosto transbordante de felicidade. Pela segunda vez na vida sentiu ódio de si próprio.

Três dias depois do casamento, partiram em viagem de núpcias pela Europa, oferta dos padrinhos dela, não sem que primeiro ele tivesse levado os pais e a madrinha ao aeroporto de regresso à Terceira.

Deve admitir que durante a viagem de núpcias e nos primeiros tempos do casamento conheceu alguma felicidade. Mas um casamento assente naquelas premissas tinha inevitavelmente que esfriar. Ademais a Sofia levava longe de mais a sua vocação para a vida doméstica que até exibia nos actos de amor. O nascimento dos filhos (primeiro a pequena um ano após o casamento; depois o pequeno dois anos mais tarde) não tendo trazido qualquer valor acrescentado à felicidade do casal, teve ao menos o condão de preencher a vida dela e permitir a ele mais alguma liberdade para se dedicar à sua profissão onde ganhava cada vez mais sucesso.

Findo o estágio que decorreu com normalidade e durante o qual teve oportunidade de avaliar a importante clientela que o sogro fora capaz de granjear - e também a sua grande fortuna - acertou-se a data do casamento que - para não variar, pensou com ironia – se realizaria em Castelo Branco, onde aliás residia quase toda a família dela. Ele custeou a viagem…





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