24 de Abril de 2024
O "desastre" do 16 de março e a zanga de Melo Antunes
Lusa

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Antes do 25 de Abril de 1974, o falhanço do golpe de 16 de março ameaçava deixar o Movimento dos Capitães sem o seu ideólogo, Ernesto Melo Antunes.

A conversa que convenceu Melo Antunes a ficar foi no Café Londres, em Lisboa, que, antes de partir para os Açores, elaborou as bases programáticas do MFA.

 

 

O golpe falhado que quase deixou a revolução sem ideólogo

 

O falhanço do 16 de março foi um golpe no moral das tropas. “No meio daquele desastre”, recordou Otelo, ainda foi preciso evitar outro: a saída da “peça essencial” para as bases programáticas do Movimento das Forças Armadas (MFA) e da própria revolução, Ernesto Melo Antunes.

Logo após o 16 de março, Vítor Alves contactou Otelo para lhe pedir para “tranquilizar o Melo Antunes”, que descontente com o que se tinha passado naquele dia, decidira abandonar o movimento.

A 18 de março, no café Londres, na praça com o mesmo nome em Lisboa, os três encontram-se, já com Melo Antunes “de malas aviadas” para daí a quatro dias embarcar para os Açores, de onde a mulher era natural, e para onde tinha pedido transferência há mais de um ano.

“Tinha feito esse pedido, e só depois do 16 de março é que obtém a transferência para os Açores. É o próprio Governo que aproveita aquele pedido de transferência para o chutar daqui. A 18 de março eu e o Vítor Alves encontramo-nos com o Melo Antunes e ele diz-me logo à cabeça. ‘Eh pá, o Vítor Alves já te disse, eu abandonei o movimento, já não estou aí. Não estou disponível para brincadeiras tipo 16 de março. Não estou disponível para isso, portanto salto’. E eu disse-lhe: ‘Eh pá, ó Melo Antunes, o Vítor Alves já me falou nisso, mas tu não podes abandonar o movimento, porque no âmbito do exército, pelo menos do que eu conheço, ninguém tem a experiência, nem a apetência política que tu tens, que te levou até a seres candidato pela oposição às eleições parlamentares de 1969. Tu és o homem com maior cabedal político que eu conheço, que está em atividade. Portanto, não podes fazer isso’”, apelava Otelo.

Perante o “mas é que eu não estou disponível para este tipo de aventuras” que ouviu em resposta, Otelo viu-se forçado a um ‘mea culpa’ e prometeu que sairia da reunião do MFA, marcada para dia 24, uma “decisão final”. Qual? “Derrubarmos o Governo pela força. E vamos executar uma operação militar que eu garanto que vai ter sucesso absoluto”, assegurou Otelo.

“Ernesto, o que te peço é que te mantenhas no movimento. Tu vais para os Açores, mas antes de ires para os Açores vais elaborar um programa político, umas bases programáticas que possamos ter na mão para sustentar a ação militar, que estou convencido vai ser vitoriosa”, pedia Otelo.

Melo Antunes reconsiderava: “Mas já não tenho tempo. No dia 22 à noite tenho que estar no aeroporto para seguir para Ponta Delgada”.

Otelo contrapunha: “Eh pá, tens hoje, 19, 20, 21. Tens três dias. Faz as bases programáticas, entregas isso ao Vítor Alves”.

Melo Antunes anuiu, mas pediu uma reunião antes de embarcar para ler o seu trabalho.

“’Sim, senhor. Marcamos a reunião para dia 22 à noite, sábado em casa do Vítor Alves’. Fizemos a reunião, o Melo Antunes leu as bases programáticas, a malta toda: ‘Sim, senhor, está excelente’. Ficou o Vítor Alves de posse das bases programáticas”, recordou Otelo.

 

 

A revolução tinha que passar na rádio

 

Otelo ainda tinha mais um pedido a fazer a Melo Antunes antes de ele partir para os Açores: “Ó Ernesto, tu antes de ires para o aeroporto, tu tens conhecimento de algum jornalista, alguém que esteja aí ligado a um programa de rádio qualquer, ou na Rádio Renascença, ou na Emissora Nacional, ou no Rádio Clube?"

Uma rádio de âmbito nacional era fundamental nos planos da revolução. Melo Antunes não conhecia ninguém na rádio, mas conhecia quem podia conhecer. Ao aeroporto foi despedir-se dele um amigo jornalista, Álvaro Guerra, do jornal República, que iria ser apresentado ao Almada Contreiras antes do embarque.

“E o Álvaro Guerra prontificou-se imediatamente perante o nosso camarada. Tinha no República um colega que colaborava num programa da Rádio Renascença. E foi assim que chegámos, através do Álvaro Guerra, ao Carlos Albino, que era colaborador do programa ‘Limite’ na Rádio Renascença”, lembrou Otelo.

 

 

A senha que escapou à censura

 

“O Almada Contreiras diz-me hoje que a ideia do ‘Grândola, Vila Morena’ partiu dele. Eu queria que fosse uma canção do Zeca Afonso, que era mais afirmativa, mais chamativa, em termos de esquerda, mas as canções que eu propus e que o Costa Martins também propunha estavam no índex da censura. Eram o ‘Venham mais cinco’ ou o ‘Traz outro amigo também’. Não podiam ir para o ar, porque o censor estava no estúdio”, recordou Otelo.

Para contornar a censura, lembraram-se de ‘Grândola, Vila Morena’, “porque tinha sido cantado pelo Zeca Afonso, com o Fausto e o José Jorge Letria e o Vitorino, no Coliseu, no sarau da Casa da Imprensa, que tinha tido lugar a 29 ou 30 de março, à volta disso”.

Otelo não tinha nada a opor: “Quando me vêm dizer se podia ser, eu: ‘Encantado! O Grândola, Vila Morena, eu tinha o disco em casa, ótimo! ‘O povo é quem mais ordena, dentro de ti ó cidade’, está a andar, sim senhor, vamos embora’”.

Antes do 25 de Abril de 1974, o falhanço do golpe de 16 de março ameaçava deixar o Movimento dos Capitães sem o seu ideólogo, Ernesto Melo Antunes.

A conversa que convenceu Melo Antunes a ficar foi no Café Londres, em Lisboa, que, antes de partir para os Açores, elaborou as bases program&aacut…





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