Investigadores ouvidos pela agência Lusa consideram que a política colonial portuguesa foi diferente das outras devido ao menor poderio militar e capacidade tecnológica comparativamente às outras potências coloniais.
Para o economista e professor universitário Jonuel Gonçalves, apesar das diferenças há a destacar um objetivo comum nas políticas coloniais europeias.
“O objetivo de todos os poderes coloniais era extrair o máximo possível de recursos naturais e explorar da forma mais completa para baixar os custos de produção. As diferenças são tão pequenas que muita gente diz que o sistema colonial português, inclusive, era mais penalizante porque a metrópole tinha menos meios”, considera.
Para Clara Carvalho, professora no Departamento de Ciência Política e Políticas Públicas do ISCTE-IUL, é com o chamado Ato Colonial, integrado na Constituição portuguesa de 1933, que passa a existir de facto uma política colonial em Portugal.
O Ato Colonial é o primeiro documento constitucional do Estado Novo, promulgado em 08 de julho de 1930, quando António Oliveira Salazar assumia as funções de ministro Interino das Colónias e quando as potências europeias com colónias tinham há muito avançado na regulamentação da administração desses territórios.
Clara Carvalho acrescenta que a política colonial portuguesa é muito tardia e para a maioria dos territórios que eram então colonizados, só se torna efetiva a partir da Segunda Guerra Mundial, “que é precisamente quando os outros países começam a descolonizar”.
“Nós não conseguimos entender este grande atraso na colonização portuguesa se não entendermos também o papel de Portugal na Segunda Guerra Mundial, que é completamente diferente daquilo que acontece a outras potências colonizadoras na Europa, porque Portugal não está envolvido na guerra e Portugal queria um acordo com os Estados Unidos que depende muito da possibilidade da utilização da Base das Lajes nos Açores”, detalha.
A partir deste ponto, a relação entre Lisboa e Washington passa a ser marcada por “uma certa concórdia e que é diferente da relação que os Estados Unidos vão ter seguidamente com as outras potências colonizadoras”.
Jonuel Gonçalves defende que Portugal “começou então a adotar alguns princípios que eram correntes, no caso do império francês, como as noções de assimilação e de trabalho contratado, para substituir o trabalho escravo. A assimilação era para tentar criar uma pequena elite africana”.
“Salazar tinha como conceito que as colónias, primeiro, eram um fator que ajudava a balança de pagamentos de Portugal, porque concentravam superávites, sobretudo Angola e Moçambique. E depois achava também que era importante, do ponto de vista de prestígio de Portugal como potência tão pequena, que tinha de manter aquilo para ter voz internacional. As diferenças são desse tipo”, frisa.
Fernando Jorge Cardoso, professor catedrático convidado da Universidade Autónoma de Lisboa e investigador do OBSERVARE, da mesma universidade desde outubro de 2021 e do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL, destaca outra diferença, partindo agora do modelo britânico.
“O império britânico efetivou uma administração indireta”, ou seja, não se meteu nos assuntos culturais nem nos religiosos, interessando aos britânicos que quem ficasse a controlar os territórios deveria aceitar que o poder maior era o do governador-geral britânico em nome da Coroa, que as empresas inglesas teriam prioridade na exploração das riquezas do território e, finalmente, a última palavra nas questões de defesa e segurança seria também sempre de Londres.
Portugal e outros países com colónias em África – França, Itália, Alemanha, Bélgica e Espanha - optaram pela administração direta.
“Nesse sentido, sim, há uma diferença de colonialismo e essa diferença é de governação. Estes países, ao praticarem uma colonização direta e em praticamente todos os casos, tentaram evangelizar, ou seja, não proibiram, mas acabaram por impor as respetivas religiões, neste caso católica, aos territórios que controlavam em África e nesse sentido, também se imiscuírem nas questões de natureza cultural”, afirma.
“Quem se imiscui mais claramente são os portugueses, porque os portugueses, ao recusarem a descolonização no início dos anos 1960, mudaram o nome de colónias para províncias”, invocando que se tratava da “grande nação portuguesa”.
“E ao fazerem isso, temos uma tentativa deliberada de exercício não só de um controlo direto, mas também de uma imposição de uma cultura proveniente da metrópole, no sentido de tentar criar aquilo que os ideólogos do fascismo propugnavam que era, digamos, uma cultura que integrasse na cultura tradicional portuguesa elementos das culturas dos países que faziam parte de Portugal”, adianta.